Eis o rosto de Apolo iluminado!
Eis o mundo coberto de alegria!
Quando sorri um deus, fica doirado
O céu que a sua raiva enegrecia.
Eis a luz da verdade
Aberta sobre a noite da mentira!
Eis a harmonia que nenhuma lira
Reproduz!
Ressuscitada e alada, a criação
Deixa morta no chão
A sombra secular da sua cruz.
Transparente e feliz, tudo parece
Representar num palco de magia;
Mas corre-se a cortina à fantasia
E a estranha maravilha permanece!
Nada tem a espessura, que mostrava
À cegueira de cada hesitação.
Nada tem um taipal de solidão
A rodear-lhe os passos.
Gestos, hostis na escuridão,
São abraços!
Verdes, amadurecem
Os corações;
Velhas, rejuvenescem
As ilusões;
E na mesma fogueira onde se aquecem,
Comungam sentimentos e paixões.
Miguel Torga
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