novembro 22, 2012

Observo


Observo. Sobretudo, observo. E quando dos meus olhos já transbordam imagens que se cruzam, entrecruzam e que se querem libertar do aperto da retina que as retém, então verbalizo o que sinto e transformo-as em palavras.
Por vezes ficam presas na garganta, recusam-se a sair e desenvolve-se uma luta física entre a vista e a voz, uma a querer libertar-se a outra a recusar-se à liberdade. Há um conflito de interesses difícil de ultrapassar. Normalmente são as palavras cinza as que a garganta não quer libertar, aquelas que não queremos dizer para não enublar o arco iris que nos envolve. Mas para quê querer um arco iris se é de plástico e só serve de cenário? A realidade vai muito para além do arco iris e aliás, já alguém alguma vez conseguiu tocar um? São etéreos e tudo o que assim é, vive no mundo celeste, no dos sonhos que tentamos alcançar.
Por isso o melhor é mesmo passar para palavras o que vou observando:
Tenho quarenta e poucos anos. Se transformarmos a vida num gráfico semelhante ao da vida de um produto, estou agora no ponto cimeiro, logo após a curva descendente. Deveria deixar-me ir no escorrega e deslizar lentamente para os anos dourados de bodas de ouro e pantufas quentinhas. Mas isso é só para quem se resigna, ou para quem viveu numa outra época em que isso seria possível. Hoje em dia as coisas mudaram. Hoje em dia, o que no dia anterior era adquirido passou a estar hipotecado. A profissão, os rendimentos, a materialidade e imaterialidade da vida. Tudo se vende, tudo se compra. Exceto a dignidade, claro! (e mesmo assim, ainda há quem a tente vender…).
A verdade é que o mundo mudou e assistimos a uma mudança de paradigma, a uma mudança brutal de conceitos, de valores e sobretudo de modos de vida para os quais não estávamos habituados. E a mudança dói, especialmente quando não fomos nós que a desejámos.
Andamos todos confusos, perdidos neste mar de instabilidade, sem porto de abrigo à espera de um cais que nos acolha, sem rumo, sem mapa, navegando à bolina até encontrar terra firme e sem saber onde encontrá-la. Esperamos. E enquanto esperamos sentimos a insegurança como nunca a tínhamos sentido. Tornou-se quase palpável, física. Demasiado real, ensombrando-nos a vida.
Na minha idade as minhas preocupações, e de acordo com o gráfico da vida, deveriam ser apenas a incerteza da escolha do local de férias… (ou talvez não, porque eu não sou de me resignar, e cada dia são mais 24 horas para poder fazer algo de novo). Neste momento as minhas preocupações são saber onde estarei amanhã. Um dia de cada vez, um dia a seguir ao outro e outros chavões do género que curiosamente se aplicam hoje na perfeição, quando não há mais nada para dizer.
Ler notícias é constatar esta realidade. Ver televisão é constatar esta realidade. As imagens preenchem-me a retina. Transborda. Tenho de verbalizar.
Querer é poder, dizia o outro, não sei bem quem, mas alguém que se permitia esses luxos. E eu bem que queria ter uma visão seletiva, mas não tenho esse luxo.