maio 27, 2005

Reflexões


Há alguns anos atrás, aliada que andava dos problemas que assolavam o nosso país, achava que era bom viver em Portugal, comparado com outro país onde vivi e outros que visitei. Achava que a joie de vivre que por cá se propagava era suficiente para esquecermos todos os problemas conjunturais, todas as carências sociais e económicas.
Passados uns anos, mais madura e inteiramente inserida na sociedade económica e social, apercebo-me que esta joie de vivre serve de disfarce e de mentalização psicológica para esquecermos o que verdadeiramente afecta o nosso dia-a-dia, no fundo é a máscara utilizada por quem não tem nada, nem aspira a ter, face à conjuntura económica que não nos dá razões para pensarmos de outra forma.

Pensem numa família de classe média, empregados por conta de outrem, que todos os meses vive em função de dois ordenados contados até ao último cêntimo, divididos pelas prestações da casa e do carro, pela escola dos filhos, pelos ateliers de tempos livres, pela água, pela luz, pelo telefone e telemóveis, entre outros que a vossa imaginação ou carteira permita lembrar. Vivem uma vida, uma só, como todos nós, mas uma vida endividada. Conseguem prever a longo prazo o que poderão, ou não poderão ter, durante toda essa vida. Psicologicamente isto é terrível! Saber de antemão, que as coisas mantendo-se como estão, só terão direito àquilo que esses dois ordenados lhes permitam, é avassalador. É uma condenação sem cárcere, mas uma condenação perpétua.
O Estado bem nos aconselha a sermos empreendedores. Porém quando os cêntimos estão contados até ao último, como é que podemos arriscar seja o que for? Ideias talvez não faltem, mas quando, todos os dias, assistimos à falência de um Estado que é o nosso, cujos principais protagonistas nos pintam cada dia um futuro mais negro, para onde vai a coragem? Haverá condições para sairmos do buraco onde nos metemos? Poderemos pedir contas aqueles que nos arrastaram para esta situação? Poderemos algum dia vir a ser europeus? Ou melhor, sentirmo-nos como os outros europeus? Ou seremos para sempre o irmão (ou primo afastado) mais pobre? Sentiremos para sempre este agastamento? Esta discriminação?
Para nos ajudar, este Estado que é o nosso, aumenta-nos os impostos, reduz-nos a qualidade de vida, sem nos dar a certeza de que com estas medidas Portugal será algum dia um País com joie de vivre na verdadeira acepção do termo.

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